quarta-feira, 9 de maio de 2012

UM MOURA NA GUERRA DO PARAGUAI



Marcolino de Moura e Albuquerque cursava Direito na Faculdade de Recife quando, em 1865, irrompe a Guerra do Paraguai em decorrência de disputas territoriais que também envolveram o Uruguai e a Argentina.

A mobilização de tropas regulares e voluntárias, ordenadas pelo Império brasileiro teve grande adesão na Bahia. Até fevereiro de 1866, segundo informe do Presidente da Província, no Relatório Anual apresentado à Assembléia Legislativa, 10.189 praças já haviam marchado para o sul.

Destes soldados, 386 integravam o Batalhão Imperatriz sob o comando do então Tenente-Coronel Marcolino de Moura e Albuquerque, que suspendera seus estudos para atender ao apelo nacionalista.

Sobre sua participação na Guerra são encontrados alguns registros que merecem destaque porque ajudam a elucidar o seu nível de participação no processo. O primeiro deles, é descrito no livro “A História da Guerra do Paraguay” publicado em 1870. No seu volume III, pág. 86, lê-se que:

“Na batalha de 24 de maio, distinguiu-se o tenente-coronel Marcolino de Moura Albuquerque, comandante do batalhão 22 de voluntários da Bahia.
Estudando direito em Pernambuco, abandonou os bancos acadêmicos para acudir ao reclamo da pátria ultrajada: vindo como major desse batalhão, tomou logo seu comando. Assistiu aos principais combates, e no dia 24 de maio, tomando a bandeira do seu batalhão, pôs-se na frente, e assim guiou na carga que desbaratou o inimigo.
Esse feito foi elogiado em ordem do dia. Ficando o batalhão 22 de voluntários muito reduzido, e sendo o batalhão mais moderno foi dissolvido; oferecendo-se ao seu bravo comandante outro batalhão, não aceitou.”

A batalha a que se referem os autores é a de Tuiuiti, uma das mais importantes da guerra e que se desenrola em território paraguaio, em 24 de maio de 1866. Escrito e publicado logo após a guerra, o livro deixa transparecer um claro o tom ufanista, o que não tira os méritos de Marcolino de Moura, ao contrário.

O segundo episódio a comentar revela particularidades que o recrutamento podia assumir, sobretudo por levar ao questionamento sobre o seu caráter voluntário. O palco do debate foi o Congresso Nacional. Ali, em 4 de julho de 1867, o deputado Frederico de Almeida e o deputado Junqueira pautavam a discussão sobre a validade das eleições recém realizadas no distrito de Lençóis, na Bahia. Ressalte-se que o Dr. Marcolino de Moura ainda não ocupava uma cadeira no legislativo. O congressista Frederido de Almeida relatava uma ocorrência policial havida no município, e sob a alegação de que a participação do tenente-coronel Marcolino de Moura nos acontecimentos fora indevida, pretendia ver anulado o pleito.

Conforme registrado nos “Annaes do Parlamento Brazileiro”, de 1867, o Dr. Marcolino de Moura “depois de combates gloriosos no Paraguai, voltara ao interior da Bahia para ali adquirir voluntários” para a guerra. Sabendo que um determinado grupo de homens estava preso e seria submetido a processo pela morte de um guarda, resolve o tenente-coronel intervir, pedindo ao Delegado daquela circunscrição que consentisse em que os presos seguissem viagem consigo na condição de voluntários. Obtida a concordância, os novos recrutas foram conduzidos sob custódia do tenente-coronel à Capital da Província. No debate, o deputado Almeida pleiteava a nulidade da votação havida meses antes, afirmando o tenente-coronel teria atuado no sentido de beneficiar um correligionário seu que se candidatava naquele pleito.

A despeito da discussão sobre a natureza da intervenção do Tenente-coronel na prisão ou soltura daqueles cidadãos, se tivera ou não o objetivo de ajudar um companheiro de partido, o que nos interessa no momento é destacar que após sua participação na frente da guerra, ele retorna à Bahia para compor um novo agrupamento de soldados, mais ou menos “voluntários”.

Finalmente, o último achado da pesquisa é igualmente peculiar e se refere ao uso da capoeira na guerra. Segundo o artigo “Reflexões sobre o surgimento da capoeira no Brasil: um olhar sobre a história”, os autores (Gorito e Assis) reportando a outro estudo de Ferreira(2007) sobre a Guerra do Paraguai ressalta a prática da capoeira numa situação extremamente delicada.

Assim, afirmam que “por ocasião do assalto final e a tomada da ponte de Itororó”, a 12 de dezembro de 1968, os soldados do 31º Corpo de Voluntários da Pátria sob o comando do Coronel Assunção, “seguidos pelos zuavos baianos sob o comando do Dr. Marcolino de Moura e Albuquerque, vendo esgotada a munição em pleno combate corpo a corpo... jogaram fora as espingardas...” e tomando as baionetas atacaram os inimigos "com arma branca e golpes de capoeiragem". Uma passagem, vale dizer, no mínimo heróica dos combatentes.

Finda a guerra, o Dr. Marcolino de Moura retoma seus estudos tornando-se bacharel de direito, e assumindo a bandeira do abolicionismo, ao lado de Joaquim Nabuco e outros. Eleito deputado federal, sua atuação no Congresso Nacional não abandonou a temática da Guerra do Paraguai, mais especificamente, a defesa dos que lutaram e não obtiveram os benefícios prometidos.

O projeto de lei 139, de sua autoria, estabelecia a concessão vitalícia aos oficiais e praças do pagamento de soldo integral correspondente ao posto ocupado à época da campanha. O projeto buscava tornar efetivo um dispositivo do decreto imperial de 1865 que criou os Corpos de Voluntários da Pátria. Ocorre que a aplicação da norma não assegurou o direito a todos os voluntários, estabelecendo restrições.

Marcolino argumentava, em outubro de 1905, ao discursar em defesa de sua proposta, que já havia passado mais de 35 anos desde o fim da guerra e que muitos dos  que ali lutaram estavam ao desamparo. Arguia, ainda, que já era reduzido o número dos beneficiários e que os encargos assumidos pelo Estado logo cessariam com o desaparecimento completo desses servidores da Pátria. Nesta campanha, no entanto, o deputado não logrou êxito.

Pouco tempo depois, em 1908, morre o Bacharel de Direito, Abolicionista, Tenente-Coronel na Guerra do Paraguai, Constituinte de 1891, Deputado Provincial, Deputado Federal do Império e da República, o Dr. Marcolino de Moura e Albuquerque.


NVJ


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