quinta-feira, 18 de julho de 2013

O ATUANTE GABRIEL

Faleceu anteontem, em São José dos Campos, São Paulo, o Sr. Gabriel de Vasconcellos Bittencourt. Assim se lê no obituário da edição da Folha da Manhã, de 6 de outubro de 1939. Nascido em Minas do Rio de Contas, Bahia, em 12 de dezembro de 1875, Gabriel era um dos filhos de Rodrigo e Umbelina, sendo irmão, portanto, de Faustino de Vasconcellos Bittencourt.

Gabriel acompanhou os pais quando estes se deslocaram para Casa Branca, SP, no final dos anos oitocentos. A falta de informações entre os familiares remanescentes na Bahia, e a curiosidade sobre o seu paradeiro, levou à busca de referências em notícias publicadas na imprensa paulista, resultando em verdadeiro quebra-cabeça o qual, neste texto, se pretende montar uma pequena parte.

No caso de Gabriel há muitos achados, em parte devido à sua militância política no Partido Republicano Paulista, o PRP, assim como por sua atuação como “homem de imprensa”.

Sua vida, ele compartilhou com D. Auta de Moura Bittencourt, com quem se casou, sendo filha de Antônio Martiniano de Moura Bittencourt, ambos migrantes das Minas do Rio de Contas. Radicaram-se na mesma região, no município de Palmeiras, hoje Santa Cruz das Palmeiras, desmembrado de Casa Branca.

O primeiro registro da atividade de Gabriel foi encontrado nos anos de 1890, quando tinha apenas 15 anos de idade. Na edição de 30 de dezembro do jornal o Estado de São Paulo, publicou-se o resultado de exames para “Chorographia e História do Brasil” – tratava-se de uma disciplina que cuida da descrição geográfica e história do país, na qual o aluno obteve o conceito de “simplesmente” aprovado.

São informações pontuais, mas que representam joias na tentativa de compreender a trajetória dos Vasconcellos Bittencourt no interior paulista. No caso específico, de Gabriel.

Anos depois, em 30 de setembro de 1899, o Diário Oficial, informa 
ter sido nomeado Capitão-assistente do Estado-Maior, 8ª Brigada de Cavalaria da Guarda Nacional, posto do qual seria dispensado pouco tempo depois, assim como todos os seus irmãos e amigos, numa reestruturação daquele Corpo paramilitar.

Sua atividade social levou a que, em julho de 1901, fosse elevado ao 2o grau, na Loja Maçônica de Tambahú, capítulo “Humanidade e Progresso”. Em fevereiro de 1902, é mencionado numa discussão sobre a legalidade das eleições no município, referido como segundo Juiz de Paz. Tambahú foi desmembrado de Casa Branca, processo em que teve grande destaque o Sr. José de Vasconcellos Bittencourt, provável tio de Gabriel (1).

Foi nos anos 30, no entanto, que o nosso biografado parece ter abraçado a política com mais determinação (2). Na cidade de Palmeiras, integrou a comitiva que em fevereiro de 1930, recebeu o candidato à presidência da República, Júlio Prestes, em plena campanha eleitoral. Vale dizer que o então Governador de São Paulo, acabou sendo eleito Presidente do Brasil - o último da República Velha, mas não tomou posse em função da Revolução de 30, que levou Getúlio Vargas ao poder, em novembro daquele ano.

A resposta paulista foi a Revolução Constitucionalista de 1932, que criticava a suspensão da vigência da Constituição republicana, opondo-se desta forma ao Governo Vargas. Foi uma guerra civil, na qual se estima mais de 3 mil mortos entre os paulistas e as forças federal e de outros estados, inclusive da Bahia, que foram ao combate em São Paulo.

Parte do esforço paulista para a guerra, a Campanha do Ouro conclamava a população a doar o metal precioso para produzir ou adquirir armas e atender a outras necessidades da campanha militar. O compromisso de Gabriel se manifesta nas doações que fez, conforme registro do jornal Folha da Manhã, de 20 de agosto de 1932. Diz que, em Palmeiras, foi entregue na Coletoria Estadual entre outros donativos, “uma insígnia maçônica Gr. 3; uma moeda de cobre de 1822; um par de botões de punho em ouro; uma guarnição de botões de ouro de punhos e peito; um par de esporas de prata, entregues por Gabriel de Vasconcellos Bittencourt”.

Finda a Guerra, nosso personagem participa ativamente do Partido Republicano Paulista, o PRP, partido que desde os anos 70 do século anterior tinha hegemonia da política estadual, elegendo todos os governadores daquele estado. Anota-se, especialmente no jornal Correio Paulistano, manifestações de Gabriel de apoio à Comissão Diretora estadual daquele partido. Em fins de 1937, o PRP é extinto com a instalação do Estado Novo.

Gabriel de Vasconcellos Bittencourt também se destacou na vida pública como Diretor-proprietário do jornal “A Cidade” no município de Palmeiras, a partir do qual se relacionava com jornais paulistas de maior circulação. Integrava a Associação Paulista de Imprensa, participando ativamente na escolha da representação da categoria profissional dos jornalistas (3).

Por fim, dois últimos registros são encontrados na imprensa daquele estado. No primeiro deles, datado de maio de 1939, o correspondente da Folha da Manhã, em Palmeiras, informa que “encontra-se em franco restabelecimento da moléstia que o reteve ao leito, nosso companheiro de imprensa”. Cinco meses depois, entretanto, o noticiário dá conta do falecimento de Gabriel em São José dos Campos, onde seu corpo foi enterrado.

Dona Auta de Moura Bittencourt, sua esposa, faleceu na capital paulista, em 1958, quase vinte anos depois, aos 78 anos de idade (4). Não foram encontrados registros sobre a existência de descendentes do casal.

Contar a história de alguém a partir de notícias esparsas encontradas em jornais publicados décadas antes, ainda que se tente contextualizar historicamente, pode não oferecer uma imagem apropriada, mas não havendo anotações ou história oral, foi a alternativa que restou. Mas sempre podem surgir novas informações e assim vai-se enriquecendo esta trajetória familiar.

Referências e Notas
(1) Nesta colcha de retalhos de informações dispersas, há notícias dos mais variados tipos que se referem a GVB:
- em julho de 1911, põe à disposição da secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo, mais precisamente da Diretoria de Indústria Animal, para estudos científicos, “um animal atacado de osteomalacia”;
- Folha da Manhã (14/06/1931). Publicação: Ordem do Dia para julgamentos na 2ª Câmara, Palmeiras. Agravante: Gabriel de Vasconcellos Bittencourt.
- Folha da Manhã (17/05/1933), Gabriel, Diretor do diário local de Palmeiras, registra primeira comunicação telefônica com a cidade de São Paulo, feita da redação de “A Cidade”.
- Folha da Manhã (05/01/1934) Despacho da Secretaria de Justiça e Segurança de São Paulo, indefere pedido de pagamento a Gabriel de Vasconcellos Bittencourt, Juiz de Paz da sede da Comarca de Palmeiras.

(2) Notas sobre a participação política de GVB:
- Correio Paulistano(18/10/1934) Na condição de Fiscal da eleições que acontecem em Palmeiras, GVB publica protesto apresentado contra representante do Partido Constitucionalista, que supostamente estaria pressionando os eleitores.
- Correio Paulistano (22/03/1936) Na condição de Delegado do Partido Republicano Paulista acompanha o recebimento de urnas das eleições municipais. Uma foto em que figura GVB, ilustra o texto.
- Correio Paulistano (13/12/1936) registra a passagem do aniversario de Gabriel, em 12 de dezembro.
- Correio Paulistano (20/03/1936) Gabriel integra comissão de honra que, em Palmeiras, da campanha de iniciativa da Escola Paulista de Medicina, de dotar São Paulo de um "eficiente estabelecimento hospitalar".
- Correio Paulistano (08/05/1937) Gabriel integra uma longa lista de partidários, que se declaram solidários à Comissão Diretora do PRP, lamentando a "retirada dos dois companheiros”.

(3) Sobre sua vinculação com a imprensa:
- Folha da Manhã (29/05/1933) Associação Paulista de Imprensa publica relação de associados, entre os quais GVB.
- Correio Paulistano (13/08/1935) Gabriel vai a São Paulo votar para a escolha do delegado-eleitor da Associação Paulista de Imprensa.
- Folha da Manhã (04/08/1935), Publicação de anúncio de apoio a deputado classista, representante dos jornalistas de São Paulo, assina, entre outros GVB.

(4) Falecimento:
- Folha da Manhã (06/10/1939) Nota fúnebre anuncia o falecimento de GVB.
- O Estado de São Paulo (23/04/1958) Nota fúnebre noticia o falecimento de D. Auta de Moura Bittencourt.

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