quarta-feira, 13 de julho de 2016

Recrutamento


Este texto é sobre um longínquo ancestral dos Vasconcelos de Brumado. Trata-se do bisavô do meu avô Osório. Chamava-se José e era o pai de Rodrigo, que era pai de Faustino, este pai de Osório que foi pai de uma vasta prole. Não se sabe ao certo quando nasceu, e não  parece ter sido um dos dos três Vasconcellos Bittencourt - José, Manuel e Francisco, chegados dos Açores. O mais provável é que tenha sido filho de algum daqueles desbravadores.

No ano de 1862, ainda se ouvia ecos da Guerra do Prata acontecida dez anos antes, e cresciam as disputas territoriais que se seguiram e que estão entre as causas da Guerra do Paraguai.

Na falta de um contingente militar que atendesse às exigências do enfrentamento entre as nações do sul do continente, o recrutamento se intensificava na população civil. Foram milhares e milhares de cada Província, ano após ano. A Bahia estava entre as que mais contribuições fazia: escravos, jovens nascidos fora do casamento, delinquentes e, à medida que as forças armadas precisavam mais reforços, voluntários, praças da Guarda Nacional e população a mais empobrecida.

Naquele ano, em Rio de Contas, a polícia fez mais um desses recrutamentos, prendendo populares que preenchiam os critérios já citados, especialmente jovens. Como um grande número de efetivos da tropa regular havia sido aquartelado na cidade da Bahia, o governo da Província determinou que a Guarda Nacional conduzisse os recrutas até Salvador

A ordem foi direcionada a dois comandantes da Guarda Nacional - o Tenente Coronel Joaquim Augusto de Moura e o Tenente Coronel José de Vasconcelos Bittencourt, comandantes do 57º e 59º batalhões, respectivamente. Caberia a eles indicar destacamentos daquela força civil, com características paramilitares, para escoltar os recrutas até a Capital.

Reagindo à ordem superior, os tenentes coronéis não cumpriram a determinação, ficando os recrutas encarcerados durante sete meses nas prisões públicas da região. Na verdade, muitos recrutados eram, comumente, praças da Guarda Nacional. A patente de tenente-coronel era usualmente destinada a lideranças políticas locais, de famílias de muitas posses e influência, o que explica a disposição de descumprir uma ordem direta.

Em represália o Presidente da província, Antonio Coelho de Sá Albuquerque, em janeiro de 1863, determinou a suspensão dos dois comandantes e mais o tenente-coronel Manoel Alves de Castro Coelho, do exercício das suas funções sob acusação de negligência, fato que destacou no seu Relatório à Assembleia Provincial. Na falta de justificativa mais convincente apontou que o descumprimento se deu por "capricho" dos oficiais.

O assunto foi motivo de grande repercussão nos jornais diários da Bahia, Pernambuco e Rio de Janeiro. Houve quem elogiasse a conduta rigorosa do Presidente da Província da Bahia, mas também teve espaço quem visse nos acontecimentos uma manobra política para beneficiar opositores dos tenentes-coronéis nas eleições que ocorreriam brevemente. Um certo Sr. Espínola, a ser melhor decifrado, seria, senão um dos mentores, eventual interessado na punição aos Tenentes-Coronéis. A soltura dos recrutas encarcerados e a suspensão de novos recrutamentos até que se dispusesse de força para conduzi-los de imediato, foram medidas apontadas como parte da manobra política. Afinal, alegava-se, havia ou não contingente para a escolta? Se havia por que não foram utilizados? 


A despeito daquele acontecimento político, o povo continuou a sofrer com recrutamentos e alistamentos coercitivos por muito tempo.


Um daqueles personagens, Joaquim Augusto de Moura, se tornaria mais tarde o Barão de Vila Velha. Quanto ao tenente-coronel José de Vasconcellos Bittencourt, continuou tendo vida social e política ativa, falecendo em 1887.

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