As histórias do meu pai

O universo da infância e adolescência do meu pai estava sempre presente nas histórias que incansavelmente contava para filhos, netos, parentes e amigos. Mesmo aqueles irmãos e irmãs de memória mais rica se surpreendiam com a profusão de casos, sempre com um desfecho engraçado, quase anedota. Não faltava quem dissesse que ele inventava. Se o fazia, e creio que sim, era acrescentando algum detalhe que tornasse a situação relatada mais interessante.

Na literatura isto é estilo apurado e bem visto - partir dos fatos e desenvolver aquilo que é meio ficção e meio realidade.No seu livro lançado recentemente "O irmão alemão", Chico Buarque faz isso, desenvolvendo a história a partir de um fato real - a existência de um irmão que não chegou a conhecer.

Meu pai não escrevia histórias, ele as contava com maestria, mesmo quando derivava e puxava outros assuntos, até que, quase perdido, retomava o fio da meada da história inicial.

Escrevê-las foi uma ideia acalentada pelos filhos há cerca de uns quinze-vinte anos antes da sua morte. Primeiro, gravando e transcrevendo literalmente as suas histórias, depois fazendo ajustes para adequar a linguagem falada à escrita. Não quis continuar gravando, nunca se soube ao certo o porquê. Também não quis que fossem publicadas aquelas transcrições pois achava que poderia acontecer de alguém se zangar com algum comentário dele.

Nos últimos três anos da sua vida comecei a escrever os casos a partir das nossas conversas. As histórias, muitas delas já conhecidas porque já escutadas em outros momentos, foram sendo escritas e sempre submetidas à sua avaliação. Corrigia alguma informação incorreta, mas em geral gostava da forma como era contextualizada. Uma parceria.

Hoje, sobraram algumas anotações e lembranças de algumas histórias que ainda não encontraram seu caminho até o papel.
Saudades.

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